‘Retorno de sintomas de Covid-19 não significa reinfecção’, diz médico infectologista que analisou primeiro caso confirmado no Brasil

André Prudente Paciente fez parte da equipe que analisou caso de médica de 37 anos moradora do Rio Grande do Norte. Ela foi infectada por duas linhagens diferentes do vírus – a primeira em junho e a segunda, em outubro.

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Não basta ter “retorno de sintomas” ou novo teste positivo para coronavírus para se afirmar que houve reinfecção da Covid-19. Isso é o que explica o médico infectologista André Prudente, diretor do Hospital Giselda Trigueiro, em Natal, e um dos membros da equipe que analisou o primeiro caso de reinfecção pela doença comprovado no Brasil.

Ele ressaltou que muitas pessoas já relataram sentir sintomas mais de uma vez e até tiveram testes positivo para a doença, mas apenas isso não comprovaria a reinfecção. É preciso, no entanto, a confirmação de que a pessoa foi infectada por linhagens diferentes do vírus. Prudente afirma que o caso confirmado foi o primeiro em que todos os protocolos para identificação de uma reinfecção foram seguidos, no país.

A paciente, uma médica de 37 anos, testou positivo para a doença em junho e outubro. Nas duas ocasiões, ela teve sintomas leves. Um exame de linhagem genética confirmou que a mulher foi infectada por duas linhagens diferente do Sars-Cov-2, causador da Covid-19. Ela já está recuperada. De acordo com o médico, há pelo menos seis linhagens conhecidas circulando no Brasil.

Não basta ter retorno de sintomas e ter exame confirmatório. Para ter reinfecção, tem que ser comprovado que foram vírus de linhagens diferentes. É o mesmo coronavírus, mas com linhagens diferentes. Caso contrário, seria apenas uma recaída, uma recrudescência de sintomas”, afirmou o médico, comparando a doença à dengue, em que um paciente curado pode ficar exposto às demais linhagens.

Para confirmar a reinfecção, são seguidos os seguintes passos:

  • Paciente deve ter doença com 90 dias ou mais de diferença entre as duas ocorrências
  • É preciso ter disponíveis as amostras do teste RT-PCR (recolhidas boca ou do nariz) nas duas ocasiões
  • Os testes são reanalisados e é feito sequenciamento genético para apontar se as linhagens do vírus Sars-Cov-2 são diferentes
  • O caso foi confirmado por serem encontradas linhagens diferentes do vírus

 

O infectologista explicou que mesmo após a “morte” do vírus, partes dele podem ser encontradas nos exames RT-PCR – feitos a partir de amostras colhidas das mucosas, como boca e nariz – até 90 dias depois. Por isso, os protocolos exigem diferença de três meses entre o primeiro e o segundo teste investigados de um mesmo paciente, além do sequenciamento genético.

“Já se sabe que as pessoas que adquirem um novo coronavírus podem apresentar sintomas depois e ter teste positivo por até 90 dias, mesmo que o vírus esteja morto. Porque o exame detecta partículas de vírus, que podem continuar no organismo. Por isso é importante o sequenciamento genético”, destacou.

De acordo com o médico, os exames IGG e IGM, feitos com coleta de sangue, também são insuficientes para comprovar a reinfecção, pois apenas indicariam se o organismo já teve contato com o vírus e produção de anticorpos.

“Muitas pessoas podem melhorar e semanas depois voltar a ter sintomas. Isso não é reinfecção, é uma recaída. Na maioria das vezes, não mais pelo vírus. Na verdade, a maior parte dos sintomas não é provocada pelo vírus, mas sim pela resposta inflamatória. A dor no corpo, por exemplo, nada mais é do que os anticorpos atacando as fibras musculares onde havia vírus”, disse.

Ainda de acordo com André Prudente, a confirmação da reinfecção não é motivo para pânico, mas deve alertar aos cuidados de prevenção. “Mesmo quem já adoeceu deve continuar com as mesmas preocupações como se nunca tivessem adoecido”, pontuou.

O médico ainda ressaltou que já há casos confirmados no mundo em que pacientes tiveram sintomas mais leves e outros mais graves, na segunda ocorrência. Não seria possível definir um padrão, portanto.

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Secretarias de Saúde do RN e de Natal fazem entrevista coletiva sobre caso de reinfecção por covid-19 no RN. — Foto: Reprodução

Protocolo

 

No Rio Grande do Norte, a Secretaria de Saúde analisa casos que ocorrem a partir de 60 dias após o primeiro teste positivo. Por isso, qualquer paciente que tenha o teste RT-PCR positivo numa primeira infecção e que após 60 dias apresente qualquer sintoma de síndrome gripal deve ser investigado para possível caso de reinfecção. Ainda de acordo com o protocolo estadual, o procedimento só é válido com pacientes que apresentem o diagnóstico com a RT-PCR.

A Secretaria Estadual também determina que o Laboratório Central do Estado deve fazer uma reavaliação das duas amostras e caso ambas sejam confirmadas positivas novamente, elas são enviadas a um laboratório de referência para ser realizado o sequenciamento do genoma viral e analise comparativa dos mesmos. A partir disso, os pesquisadores dizem se houve uma reinfecção ou a reativação da doença.

As amostras da paciente potiguar foram encaminhadas para análise no laboratório da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro. A Fiocruz é referência para a investigação laboratorial de casos suspeitos de reinfecção pelo vírus SARS-Cov2, segundo o Ministério da Saúde.

O laboratório constatou a presença de linhagens distintas do vírus SARS-CoV2 nas amostras coletadas, confirmando ser um caso de reinfecção, o primeiro no Rio Grande do Norte.

O caso estava sendo investigado desde o dia 23 de outubro, data em que o Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde do RN (CIEVS-RN) recebeu a notificação sobre a suspeita.

A primeira infecção dela aconteceu em junho. Após apresentar um quadro de síndrome gripal (cefaleia, dor abdominal e coriza) no dia 17, a paciente realizou o exame RT-PCR na Paraíba em 23 de junho.

O resultado do teste foi positivo e ela se recuperou após período de isolamento recomendado.

 

A profissional da saúde, no entanto, voltou a apresentar um quadro de síndrome gripal no dia 11 de outubro. Entre os sintomas, estavam astenia (sensação de fraqueza), mialgia (dor muscular), cefaleia frontal (dor de cabeça) e distúrbios gustativos e olfativos (ausências de olfato e/ou paladar).

Ela, então, realizou um novo teste RT-PCR no dia 13 de outubro, também no estado da Paraíba, e teve um novo resultado positivo para presença do vírus SARS-CoV2, indicando novamente a Covid-19.

Rio Grande do Norte e Paraíba, então, em conjunto, iniciaram a investigação do caso.

De acordo com a Sesap, há outros cinco casos em investigação. Outros três foram investigados, mas não tinham viabilidade para análise. A pasta informou que conta com um protocolo para investigação de possíveis casos de reinfecção desde o dia 20 de outubro.

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